As guerras híbridas, o papel da inteligência do Exército e o controle civil – 1
https://jornalggn.com.br/defesa/as-guerras-hibridas-o-papel-da-inteligencia-do-exercito-e-o-controle-civil-1/
Fórum Social Mundial: Morte e Ressurreição?
https://forum21br.com.br/parceiros/fsm/forum-social-mundial-morte-e-ressurreicao/
POLÍTICA: Direita ou esquerda
Por: César Fonseca
A Revolução Francesa(1789-1815) foi o acontecimento mais marcante nos últimos séculos. Tão importante que 1789 é o marco da mudança da Idade Moderna para a Idade Contemporânea. Com o lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” essa revolução mudou o mundo. Nessa época, a burguesia procurava, com o apoio da população mais pobre, diminuir os poderes da nobreza e do clero. Com a Assembleia Nacional Constituinte montada para criar a nova Constituição, as camadas mais ricas não gostaram da participação das mais pobres, e preferiram não se misturar, sentando separadas, do lado direito. Por isso, o lado esquerdo foi associado à luta pelos direitos dos trabalhadores, e a direita ao conservadorismo e à elite.
Hoje não é muito diferente. Nas Câmaras de Vereadores, Assembleias Legislativas Estaduais, Congresso e Senado só não sentam mais à esquerda ou à direita. Mas para quem entende basta prestar a atenção nos discursos e nos debates que logo perceberá quem defende a direita e que defende a esquerda.
Os discursos da Esquerda defendem uma maior participação do Estado, Direitos Humanos e Trabalhistas, Reforma Agrária, Meio Ambiente, Cultura Popular, Agricultura Familiar, Trabalhadores, Pobres, Índios, Negros, Mulheres, Gays, pequenos empresários e comerciantes, Os discursos da Direita defende uma menor participação do Estado, Livre Iniciativa, diminuir direitos humanos e trabalhistas, defende o latifúndio, contra a Reforma Agrária, contra politicas ambientalistas, defende uma Cultura Nacional, O latifúndio, Critica os direitos dos pobres , povos tradicionais, gays e mulheres. Defende o grande empresário.
Você, amigo leitor “senta” onde? Defende direitos de quem? Você é da elite ou da Classe Trabalhadora? Quer um Governo mais elitista ou popular? Que leis você criaria ou apoiaria se fosse um político? Legislador? Seus projetos seriam para o povo ou para a elite?
PORQUE A ESQUERDA ACABOU
Por: César Fonseca
Está no ar a discussão sobre se a esquerda, realmente, acabou ou não, no reinado do neoliberalismo que produz a expansão do populismo.
Os economistas conservadores atacam o populismo como fruto da fraqueza dos partidos, que se transformam em plataformas de grupos que os manipulam pelo poder do dinheiro, sem nenhum compromisso com interesses sociais, mas, tão somente, econômicos e financeiros; acertam no diagnóstico, mas fogem das propostas de solução, do ponto de vista ideológico, porque, claramente, estão comprometidos com o capital, não com o trabalho.
Os trabalhadores, no cenário do capitalismo, que não tem mais como atender demanda por empregos, substituídos pela tecnologia e inteligência artificial, em grande escala, não têm mais a defendê-los sindicatos fortes e engajados na luta de classe, enquanto os salários caem e a pobreza cresce, incontrolavelmente, levando o capital à especulação para escapulir do holocausto dos consumidores.
O poder neoliberal destruiu a última chance de aglutinação dos trabalhadores por meio do sindicato ao eliminar o imposto sindical, na era bolsonarista fascista.
Não há motivação política dos dirigentes das agremiações, se não têm recursos para a sua organização em bases sustentáveis, como havia antes com existência do imposto a serviço do trabalho como forma de organizar luta contra o capital, nos marcos do capitalismo.
Por isso, a classe trabalhadora, sem discussão política, que se dá nas representações classistas, dispersou-se, completamente, pelo poder neoliberal, fortalecido para colocar a sua ordem em prática: diminuir crescentemente os salários sem precisar enfrentar greves.
Estas, por enquanto, persistem, sem vigor, no serviço público, mas os neoliberais cuidam de eliminá-las com a reforma administrativa em nome do enxugamento do Estado, da redução do custo Brasil, da eficiência e redução da burocracia etc, mediante ajustes fiscais e monetários conduzidos por Banco Central Independente em sintonia com parlamentarismo neoliberal.
A dispersão dos trabalhadores, sem chances efetivas de organização consistente, contribui para alienação da categoria diante do capital que a explora, graças às legislação que lhe favorece, conforme determinou a reforma trabalhista aprovada no Congresso sob domínio bolsonarista fascista.
CONCILIADOR
A proposição do governo para enfrentar o problema da uberização do trabalho, que significa supressão de, praticamente, todos os direitos trabalhistas, é uma acomodação cínica aos interesses do capital frente aos do trabalho, que não pode se organizar por falta de proteção contra impunidade da demissão de trabalhadores, sujeitos ao livre mercado.
Evidencia-se, nesse compasso da deterioração das relações capital-trabalho, o óbvio, do ponto de vista dos trabalhadores: seu revigoramento se torna impossível nos marcos do capitalismo, sabendo que as leis decorrentes das reformas trabalhistas somente favorecem o capital, amplamente protegido pelo Estado.
O maior inimigo do trabalho, com as reformas neoliberais trabalhistas, virou o próprio Estado dominado pelo capital.
Rasgou-se os resquícios de uma consciência culpada de esquerda liberal, que insistia em enganar-se a si mesma, no sentido de entender o Estado como fator de equilíbrio entre as classes sociais em conflito e não como de desagregação entre elas, visto que como o óbvio: o Estado é capital.
A lição, para os líderes sindicais, no ambiente do neoliberalismo, da financeirização econômica global, no qual não podem mais contar com o imposto sindical, é mudar o discurso: o capitalismo não protege os trabalhadores, sendo necessário sua substituição pelo socialismo.
Os trabalhadores, politicamente organizados, conduzidos por partidos que são frutos dessa organização laboral, têm, no plano democrático, que conquistar o Estado e submeter o capital ao trabalho.
É, simplesmente, o que dizem os teóricos do socialismo Marx e Lenin, com atualidade cristalina, exposta pelo neoliberalismo.
Reverter a ditadura do capital em ditadura do trabalho, do ponto de vista da práxis, é o trabalho a ser feito pela esquerda, para livrar trabalhadores da ditadura capitalista que se transmuda em democracia liberal.
Por que a esquerda, segundo o sociólogo marxista, Wladimir Safatle, acabou?
Simplesmente, porque busca o impossível: conciliar trabalho com o capital, sem garantia legal.
É a faca afiada contra o pescoço.
O resultado dessa estratégia equivocada é o acúmulo de derrotas históricas que, no ambiente da destruição das garantias trabalhistas, levam os trabalhadores às depressões sistemáticas e ao espírito de acomodação, onde viceja, amplamente, o populismo manipulado pelo Estado serviçal do capital.
No poder, a esquerda, sem ter por fim o objetivo de substituir capita pelo trabalho, na luta política, obrigada a dormir com o inimigo, por meio de conciliações sistemáticas, vai se desfigurando, transformando-se em centro político que acaba levando-a à direita, o berço do populismo capitalista sob o qual se encontra totalmente dominada.
Economia de guerra
Por JOSÉ LUÍS FIORI*
O novo projeto alemão para a União Europeia
Quatro fantasmas assombram a Europa neste início de 2024: a crise econômica, a revolta social, a volta do fascismo e a guerra com a Rússia. A Comissão Econômica Europeia está prevendo, para 2024, um crescimento do PIB de apenas 0,9%, e o Banco da Inglaterra, depois de dois anos de estagnação, está prevendo um crescimento britânico de 0,25%. E esta é a expectativa com relação a quase todos os países europeus, paralisados por suas altas taxas de juros, de inflação e de desemprego.
Como consequência quase direta desta crise, multiplicam-se as greves e os protestos sociais, de leste a oeste, e de norte a sul do continente, onde avançam os partidos de extrema direita, e os movimentos fascistas adquirem cada vez maior força eleitoral, ameaçando os próprios fundamentos ideológicos e políticos do projeto de unificação da Europa.
Não há dúvida, entretanto, de que foi na Alemanha que os impactos da Guerra da Ucrânia se fizeram sentir de forma mais contundente e destrutiva. A economia alemã retrocedeu 0,4% no último trimestre de 2023, e deve contrair ainda mais 0,1% no ano de 2024. E, mais grave do que isto, os alemães sofreram uma grande perda de competitividade, e vêm enfrentando um acelerado processo de desindustrialização depois de suspender seus contratos de importação da energia barata da Rússia – uma estranha maneira de punir os russos que está destruindo a própria economia alemã.
O preço da energia subiu 41%, as greves de transporte são cada vez mais frequentes e extensas, e os protestos dos agricultores alemães são quase permanentes. Por outro lado, as pesquisas de opinião indicam que o partido da extrema direita, Alternativa para a Alemanha (AFD) já conta hoje com o apoio de 19% dos eleitores, deve se transformar no segundo maior partido alemão. E não é impossível que seja chamado a fazer parte do governo alemão depois das eleições parlamentares de 2025, mesmo tendo forte presença de setores fascistas ou mesmo nazistas, que defendem posições xenófobas, anti-islâmicas, e favoráveis à retirada alemã da União Europeia.
Esta história poderia ter sido diferente se os europeus e a Alemanha, em particular, tivessem apoiado as negociações de paz entre a Rússia e a Ucrânia no início de 2022. Mas não foi isto que aconteceu. Num primeiro momento, a Alemanha adotou uma posição reticente frente à agressividade anglo-americana, mas a ala mais belicista do seu governo acabou se impondo, sob a liderança da ministra de Relações Exteriores, Annalena Baerboch, e do ministro da Defesa, Boris Pisterius, em estreita coordenação com a presidenta da Comissão Europeia, a Sra. Ursula von der Leyen, que havia sido ministra de Defesa da Alemanha entre 2013 e 2019.
Depois disto, o próprio primeiro-ministro social-democrata Olaf Scholz acabou se declarando partidário de uma “cooperação total da Alemanha com os Estados Unidos” e, de fato, durante os dois anos que já dura a guerra na Ucrânia, a Alemanha transformou-se no segundo maior fornecedor do armamento utilizando pelo governo Volodymyr Zelensky contra as tropas russas.
Uma vez definida esta posição ao lado da Ucrânia e contra a Rússia, o governo alemão criou um Fundo Emergencial de 100 bilhões de euros para aquisição imediata de armamento de última geração. E, em novembro de 2023, o ministro Da defesa Boris Pisterius divulgou as “Novas Diretrizes da Política de Defesa da Alemanha”, um documento de 19 páginas – o Zeitenwende – que define como novo objetivo estratégico das Forças Armadas alemãs transformar-se na “espinha dorsal da dissuasão e da defesa coletiva de toda a Europa”.
Junto com isto, Boris Pisterius anunciou a elevação do gasto militar alemão para 2% do orçamento federal em 2024, e para 3 e 3,5%, em 2025 e 2026, conclamando os demais países europeus a fazerem o mesmo que a Alemanha. Em completa sintonia com a Sra. Ursula von der Leyen, que anunciou sua candidatura à reeleição para a chefia da Comissão Europeia, ao mesmo tempo que prometia para breve “uma nova estratégia de defesa para a Europa” que se propõe “gastar mais, gastar melhor e gastar sobretudo com armamentos produzidos na própria Europa, utilizando-se da experiência na Ucrânia, para ultrapassar a Rússia”.
Por fim, no dia 12 de fevereiro de 2024 – em entrevista concedida à Agência AFP – o primeiro-ministro Olaf Scholz afirmou que projeto do seu governo é superar a crise econômica e assumir a liderança militar da Europa. Nessa entrevista, Olaf Scholz conclamou os europeus a “produzirem material militar em massa” e defendeu a necessidade de que a Alemanha “abandone sua indústria manufatureira para concentrar-se na produção de armamento em larga escala”, porque “nós não estamos vivendo em um tempo de paz”.
Essas mesmas ideias foram levadas à Conferência Estratégica de Munich, realizada de 17 a 19 de fevereiro, e marcada pela difusão de uma informação “confidencial” atribuída a Bundeswehr, e vazada pelo tabloide alemão Bild, que anunciava uma invasão russa do território da OTAN para o ano 2025. A informação foi desmentida, mas depois de já ter provocado o pânico generalizado e haver mobilizado o sentimento “russofóbico” dos participantes, recolocando a Rússia na condição do grande “inimigo externo” dos europeus, como já havia acontecido com a malsucedida invasão francesa da Rússia em 1812, e com a fracassada invasão alemã da União Soviética, em 1941.
Resumindo, tudo indica que, hoje, o objetivo comum da Alemanha de Olaf Scholz, e da Comissão Europeia de Ursula von der Leyde é criar uma “economia de guerra” no território europeu. Uma economia de guerra liderada pela Alemanha, que abriria mão de sua indústria manufatureira para transformar-se na cabeça de um complexo militar, integrado a partir da própria Alemanha, envolvendo os demais países europeus, segundo as “vantagens comparativas” de cada um deles. Por este caminho, é óbvio, a “Europa dos cidadãos”, idealizada por Konrad Adenauer, ou mesmo a “Europa dos mercadores”, criticada por François Mitterand, seria substituída por uma nova “Europa dos soldados e dos canhões”, como nos velhos tempos da própria Europa.
O novo projeto alemão para a União Europeia conta com o apoio dos Estados Unidos e, se tiver sucesso, confirmará o declínio e a perda de protagonismo da França, mesmo dentro da Europa. E seria uma compensação pela destruição dos gasodutos do Báltico, o Nord Stream 1 e 2, que teriam sido fundamentais para o sucesso da economia alemã. Esta nova configuração de forças dentro da Europa deverá ser sacramentada pela escolha do primeiro-ministro holandês Mark Rutte para o cargo de Secretário Geral da OTAN, no lugar do norueguês Jens Stoltenberg, com o apoio exatamente dos Estados Unidos, da Inglaterra e da Alemanha.
Mark Rutte é membro do Partido Popular para a Liberdade e Democracia, da extrema direita holandesa, militarista, xenófoba e anti-islâmica, mas muito próximo das posições belicistas e “russofóbicas” da Sra Von der Leyden, e do ministro de Defesa alemão Boris Pisterius. Neste sentido, a provável escolha de Mark Rutte para o comando da OTAN deve favorecer o processo de redefinição e centralização do poder que está em curso dentro da Europa, e que aponta na direção de Berlim.
Se tudo correr como está planejado, em cinco ou dez anos mais, a Alemanha somará à sua ascendência econômica e à sua tutela financeira do Europa, sua nova preeminência militar, incluindo sua influência sobre a OTAN, através de Mark Rutte, alcançando finalmente a hegemonia dentro do Velho Continente que vem buscando sem sucesso – por vários caminhos – desde o século XIX.
Essa estratégia vem sendo concebida junto com o governo Joe Biden, mas deve se manter mesmo em caso de vitória de Donald Trump. Se Trump vencer, é possível que a Alemanha recorra a um novo Acordo de Munique, para assegurar a cobertura atômica da Inglaterra, no caso de uma iniciativa nuclear alemã que não contasse com a cobertura atômica dos Estados Unidos. De qualquer maneira, o objetivo da Alemanha, neste momento, não é guerrear com a Rússia; é montar e comandar uma “economia de guerra” europeia, mas mesmo assim esse projeto demandará pelos menos uns cinco anos de “carência”, daí a necessidade alemã de que a Guerra da Ucrânia se prolongue na forma de uma “guerra de atrito” que não tenha vitoriosos.
Mas como ensina a história da Primeira Guerra Mundial, quando os europeus voltam às armas, eles também podem voltar à guerra, mesmo sem querê-lo: basta um erro de cálculo, provocado por uma bravata como as que costuma fazer o presidente Emmanuel Macron, ou o vazamento de uma conspiração de generais alemães para atacar a ponte da Crimeia, na Rússia, como acabou de acontecer, e toda essa cuidadosa montagem pode terminar em mais uma grande guerra europeia.
A diferença é que agora seria uma guerra da OTAN contra a Rússia e, neste caso, como disse recentemente o ex-presidente russo Daniil Mevedev, se trataria de uma “guerra assimétrica”, que obrigaria os russos a utilizar imediatamente seu armamento nuclear. Isso significa, em última instância, que se o novo projeto alemão para a Europa for bem-sucedido, ele encerraria os 80 anos de ocupação militar unilateral e explícita do território alemão pelas tropas americanas. Mas, ao mesmo tempo, recolocaria o Velho Continente na beira do abismo.
*José Luís Fiori é professor emérito da UFRJ. Autor, entre outros livros, de O poder global e a nova geopolítica das nações (Boitempo). https://amzn.to/3RgUPN3
Publicado originalmente na revista Observatório Internacional do Século XXI, n°. 4.
Oriente Mídia – Culturas da Resistência
Carta do líder supremo, Imã Khamenei, para os jovens ocidentais
Aos jovens, nos países ocidentais.
Os amargos incidentes que o terrorismo cego tem causado na França mais uma vez me levaram a conversar com os jovens. Para mim é muito doloroso que esses acontecimentos sirvam de pano de fundo para as nossas conversas, mas, de fato, se as dolorosas e graves questões não nos impulsionarem para uma solução consensual, seus danos e prejuízos serão ainda maiores.
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Oriente Mídia em português AQUI 👇🏻
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https://english.khamenei.ir/news/2681/Today-terrorism-is-our-common-worry
Leia em francês AQUI 👇🏻
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Textos de Frei Betto
SÃO PÁSSAROS E NÃO VOAM
Frei Betto
Imagino a cabeça dos que viviam entre os séculos XIV e XVI diante de tantas mudanças de paradigmas! Testemunharam, literalmente, a queda do céu. A fé, sustentáculo do período medieval, foi desbancada pelo advento da ciência. As revoadas de anjos deram lugar às explorações marítimas. Ptolomeu, ídolo dos negacionistas, cedeu o proscênio para Copérnico e Galileu.
Contudo, o otimismo voltairiano com a irrupção da modernidade, apoiada em suas filhas diletas, a ciência e a tecnologia, não se confirmou. À servidão do feudalismo sucedeu-se a opressão do capitalismo. Os prognósticos do Iluminismo não se confirmaram: malgrado a fé ateísta de Nietzsche, as religiões se robusteceram na pós-modernidade e o dogma da imaculada concepção da neutralidade científica esvaneceu-se nos cogumelos atômicos de Hiroshima e Nagasaki.
capital tornou-se senhor do mundo. É o deus Mamon ao qual todos devemos adoração. Nada se sobrepõe a ele, sejam leis, direitos humanos ou delimitações fronteiriças. Criou um Sansão que desbanca todos os filisteus e ainda não se deparou com um Davi capaz de derrotá-lo.
Sua poderosa cabeleira são as redes digitais. Elas provocam a mesma ruptura epistemológica operada no advento da modernidade pela filosofia de Descartes, a física de Newton e a literatura de Cervantes. E, na pós-modernidade, pela física quântica, a morte das grandes narrativas e a descoberta do inconsciente.
surgimento do motor elétrico no século XIX deu origem a três gerações de equipamentos comunicacionais: o rádio, que se escuta; a TV, que se mira; e as redes digitais, com as quais interagimos. Enquanto somos objetos passivos diante do rádio, da TV, do cinema e da mídia impressa, nas ferramentas digitais nos sentimos protagonistas. Temos a sensação de ter alcançado o ápice da liberdade de expressão. Findou o consenso da maioria ditado pela hegemonia da minoria. Agora cada um é rei ou rainha em sua bolha. Voltamos a nos tribalizar. Sem nenhuma consciência de que, de fato, somos manipulados por uma sofisticada tecnologia que nos introjeta um chip virtual e nos induz a nos demitir da condição de cidadãos para nos reduzir à condição de meros consumidores.
Quais as consequências de tão abrupta revolução epistêmica? Crianças e jovens têm, hoje, duplo espaço de (de)formação: o institucional (família, escola, igreja etc.) e o digital (Google, TikTok, Instagram, X, Facebook, YouTube etc.). Como são espaços antagônicos, instala-se o conflito na subjetividade. A tendência é o digital prevalecer sobre o institucional. No digital cada um encontra a sua tribo, que fala a mesma linguagem onomatopaica. E cria seus próprios valores sem dar ouvidos à voz autoritária de pais, professores, ministros religiosos e políticos. Ali cada usuário é “primus inter pares”, e não filho, aluno, fiel ou eleitor.
Há, contudo, um grave problema. Imagine fazer uma viagem de São Paulo ao Rio de Janeiro, por terra, sem que haja estradas, mapas, indicações e veículos. A vida é feita de paradigmas, referências, valores e objetivos. Quando nada disso tem solidez, pois vivemos na “sociedade líquida” (Bauman) prevista por Marx (“tudo que é sólido desmancha no ar”), sentimo-nos perdidos. Porque o tempo não espera. E quem não conhece o caminho fica sem horizonte de futuro. Cai no redemoinho do aqui-e-agora, sem que a vida encontre no tempo a sua linha de historicidade.
Daí o número de jovens que se recusam a amadurecer. Desprovidos de linguagem lógica, reféns do precário dialeto telegráfico das redes, prisioneiros de seus joguinhos virtuais, ficam à deriva no mar da vida, sem bússola. São pássaros e não sabem voar. Adultos, e ainda abrigados sob o teto familiar, parecem náufragos agarrados aos escombros de uma era que desabou, pois não aprenderam a nadar. Gritam por socorro! Sequer sabem o que é utopia – que poderia salvá-los desse redemoinho que, como um ralo de pia, suga-os para a vida shoppingcentrada e permanentemente monitorada pelas redes digitais. Muitos sofrem de nomofobia, dependência do celular. Fácil saber se você já contraiu essa doença: ao se deitar para dormir desliga ou não o celular?
Ignoro o que dirá o futuro dessa primeira geração que passou da era analógica à digital. Porém, os sintomas não são alvissareiros: ódio à flor da pele; reaparecimento da direita neonazista; economia produtiva suplantada pela especulativa; aumento das formas criminosas de discriminação (homofobia, xenofobia, racismo, misoginia etc.). Entram em cena o negacionismo, o cancelamento e a polarização. Esgarçam-se os valores éticos, o ecocídio se amplia, os direitos humanos são ridicularizados.
Enquanto miramos, perplexos, o dilúvio que afeta o Rio Grande do Sul, não percebemos que estamos à beira do abismo. Não há uma ponte chamada utopia que nos conduza à terra firme. Assim como a natureza, que em nada necessita de nós, e no seu percurso extinguiu várias espécies, como os dinossauros, agora somos nós mesmos, seres humanos, a nos aniquilar, como o ouroboro, a serpente que morde o próprio rabo.
Ainda há tempo de evitar o pior, como incentivar o pensamento crítico, introduzir o raciocínio dialético no lugar do analítico e, sobretudo, regular as redes e suas plataformas.
Frei Betto é escritor, autor do romance sobre a Amazônia “Tom vermelho do verde” (Rocco), entre outros livros. Livraria virtual: freibetto.org
DIREITA, VOLVER!
Frei Betto
Seria a história pendular? Uma no cravo e outra na ferradura? O fato é que nessa primeira metade do século XXI o mundo retrocede à direita.
O que entendo por direita? São de direita todos os negacionistas, aqueles que preferem mentiras às certezas das ciências. São de direita os racistas, os homofóbicos, os misóginos, os que se julgam superiores a todos que não têm a mesma cor de sua pele.
São de direita os que negam à mulher o direito de decidir sobre o próprio corpo, não admitem o aborto em determinadas circunstâncias, mas apoiam a pena de morte e aplaudem policiais que matam bandidos e suspeitos de crimes, e se omitem enquanto o governo de Netanyahu massacra a população civil de Gaza.
A política de direita quer o Banco Central autônomo do governo de seu país, porém dependente do sistema financeiro internacional. Abomina refugiados, grita contra a Rússia por ocupar a Crimeia e se cala frente à ocupação de Guantánamo e de Porto Rico pelos EUA.
O que se enxerga no fim desse túnel? Pelo que ensina a história, guerras. A ampliação global dos conflitos regionais, como ocorreu na primeira metade do século passado.
A democracia liberal tem um limite: a supremacia da acumulação do capital em mãos privadas. Todas as vezes que esse privilégio é ameaçado, os democratas aposentam as urnas, rasgam as Constituições e colocam as tropas na rua. Por meio de golpes de Estado ou eleições, instalam governos ditatoriais em nome da ordem, dos bons costumes e da defesa de Deus, família e propriedade.
Na primeira metade do século XX, foram os casos de Hitler na Alemanha; Mussolini na Itália; Franco na Espanha; Salazar em Portugal; Duvalier no Haiti; Somoza na Nicarágua; Trujillo na República Dominicana; Stroessner no Paraguai; e Vargas no Brasil. O período conheceu duas grandes guerras que tiveram a Europa como palco principal: a primeira, entre 1914 e 1918, e a segunda entre 1939 e 1945. As duas deixaram um saldo de pelo menos 70 milhões de mortos!
Antonio Candido dizia que a maior conquista do socialismo não ocorreu nos países que adotaram esse sistema, e sim na Europa Ocidental. Com medo do comunismo, a burguesia europeia preferiu entregar os anéis a perder os dedos. Implantou a social-democracia e ampliou os direitos da classe trabalhadora.
Derrubado o Muro de Berlim, a burguesia arrancou a máscara e exibe, agora, sua verdadeira face, a que defende a militarização das relações diplomáticas e a supremacia da acumulação do capital privado sobre o exercício dos direitos humanos. Assim, implanta governos autoritários declaradamente de direita, tolerantes com a ascensão neonazista e intolerantes com as políticas sociais dos governos progressistas. Exige ajuste fiscal e sonega impostos. As recentes eleições para o Parlamento Europeu reforçaram os partidos de centro-direita. A União Europeia se submete, hoje, aos ditames da Casa Branca.
A esquizofrenia política se acentua. Apesar de tantos eventos internacionais em prol da preservação ambiental, do combate à fome e da paz, os acordos assinados não são levados à prática. Não há força política que detenha o uso de energia fóssil, o aumento dos gastos em armamentos (em 2023, no mundo, somaram 2,4 trilhões de dólares), e os conflitos em vários pontos do planeta.
Hoje, quase 1 bilhão de pessoas passam fome no mundo. Apenas dez empresas controlam o mercado de alimentos: Nestlé, PepsiCo, Unilever, Mondelez, Coca-Cola, Mars, Danone, Associated British Foods (ABF), General Mills e Kellogg's. Todas europeias ou estadunidenses, e centradas na produção e venda de ultraprocessados, que causam danos à saúde humana.
Segundo a Oxfam, elas faturam, por dia, US$ 1,1 bilhão. O consumidor que vai ao supermercado e encontra variedade de produtos ignora que muitos pertencem à mesma empresa.
Como se altera essa conjuntura? No caso do Brasil, reforçar o governo Lula, porque a alternativa é a volta da caserna golpista; atuar intensamente nas eleições municipais de outubro em prol de candidatos progressistas; e retomar o trabalho de base. Redes digitais não são ruas. As redes fazem ruído, mas as ruas falam mais alto. Movimentos sociais, sindicais e pastorais precisam voltar aos protestos e reivindicações públicos.
No âmbito mundial, apoiar a constituição de uma nova governança global que tenha caráter mais democrático, atuação mais efetiva e supere a inoperância da ONU. Estabelecer a regulação das redes digitais, de modo a submetê-las às leis constitucionais dos países e à Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Mas será que haverá tempo para implementar medidas antes que irrompa um novo conflito mundial? O tempo dirá.
Frei Betto é escritor, autor do romance sobre a Amazônia “Tom vermelho do verde” (Rocco), entre outros livros. Livraria virtual: freibetto.org
DEZ CONSELHOS PARA OS MILITANTES CRISTÃOS DE ESQUERDA
Frei Betto
1. Mantenha viva a indignação. Verifique periodicamente se você é mesmo de esquerda. Adote o critério de Norberto Bobbio: a direita considera a desigualdade social tão natural quanto a diferença entre o dia e a noite. A esquerda encara-a como uma aberração a ser erradicada.
Cuidado: você pode estar contaminado pelo vírus social-democrata, cujos principais sintomas são usar métodos de direita para obter conquistas de esquerda e, em caso de conflito, desagradar aos pequenos para não ficar mal com os grandes.
2. A cabeça pensa onde os pés pisam.
Não dá para ser de esquerda sem "sujar" os sapatos lá onde o povo vive, luta, sofre, alegra-se e celebra suas crenças e vitórias. Teoria sem prática é fazer o jogo da direita.
3. Não se envergonhe de acreditar no socialismo.
O escândalo da Inquisição não faz os cristãos abandonarem os valores e as propostas do Evangelho. Do mesmo modo, o fracasso do socialismo no Leste europeu não deve induzi-lo a descartar o socialismo do horizonte da história humana.
O capitalismo, vigente há 200 anos, fracassou para a maioria da população mundial. Hoje, somos 6 bilhões de habitantes.
Segundo o Banco Mundial, 2,8 bilhões sobrevivem com menos de US$ 2 por dia. E 1,2 bilhão, com menos de US$ 1 por dia. A globalização da miséria só não é maior graças ao socialismo chinês que, malgrado seus erros, assegura alimentação, saúde e educação a 1,2 bilhão de pessoas.
4. Seja crítico sem perder a autocrítica.
Muitos militantes de esquerda mudam de lado quando começam a catar piolho em cabeça de alfinete. Preteridos do poder, tornam-se amargos e acusam os seus companheiros(as) de erros e vacilações.
Como diz Jesus, vêem o cisco do olho do outro, mas não o camelo no próprio olho. Nem se engajam para melhorar as coisas.
Ficam como meros espectadores e juízes e, aos poucos, são cooptados pelo sistema.
Autocrítica não é só admitir os próprios erros. É admitir ser criticado pelos(as) companheiros(as).
5. Saiba a diferença entre militante e "militonto".
"Militonto" é aquele que se gaba de estar em tudo, participar de todos os eventos e movimentos, atuar em todas as frentes. Sua linguagem é repleta de chavões e os efeitos de sua ação são superficiais.
O militante aprofunda seus vínculos com o povo, estuda, reflete, medita; qualifica-se numa determinada forma e área de atuação ou atividade, valoriza os vínculos orgânicos e os projetos comunitários.
6. Seja rigoroso na ética da militância.
A esquerda age por princípios. A direita, por interesses. Um militante de esquerda pode perder tudo – a liberdade, o emprego, a vida. Menos a moral. Ao desmoralizar-se, desmoraliza a causa que defende e encarna. Presta um inestimável serviço à direita.
Há pelegos disfarçados de militante de esquerda. É o sujeito que se engaja visando, em primeiro lugar, sua ascensão ao poder. Em nome de uma causa coletiva, busca primeiro seu interesse pessoal.
O verdadeiro militante – como Jesus, Gandhi, Che Guevara – é um servidor, disposto a dar a própria vida para que outros tenham vida.
Não se sente humilhado por não estar no poder, ou orgulhoso ao estar. Ele não se confunde com a função que ocupa.
7. Alimente-se na tradição da esquerda.
É preciso oração para cultivar a fé, carinho para nutrir o amor do casal, "voltar às fontes" para manter acesa a mística da militância. Conheça a história da esquerda, leia (auto)biografias, como o "Diário do Che na Bolívia", e romances como "A Mãe", de Gorki, ou "As Vinhas de Ira", de Steinbeck.
8. Prefira o risco de errar com os pobres a ter a pretensão de acertar sem eles.
Conviver com os pobres não é fácil. Primeiro, há a tendência de idealizá-los. Depois, descobre-se que entre eles há os mesmos vícios encontrados nas demais classes sociais.
Eles não são melhores nem piores que os demais seres humanos. A diferença é que são pobres, ou seja, pessoas privadas de justa e involuntariamente dos bens essenciais à vida digna. Por isso, estamos ao lado deles. Por uma questão de justiça.
Um militante de esquerda jamais negocia os direitos dos pobres e sabe aprender com eles.
9. Defenda sempre o oprimido, ainda que aparentemente ele não tenha razão.
São tantos os sofrimentos dos pobres do mundo que não se pode esperar deles atitudes que nem sempre aparecem na vida daqueles que tiveram uma educação refinada.
Em todos os setores da sociedade há corruptos e bandidos. A diferença é que, na elite, a corrupção se faz com a proteção da lei e os bandidos são defendidos por mecanismos econômicos sofisticados, que permitem que um especulador leve uma nação inteira à penúria.
A vida é o dom maior de Deus. A existência da pobreza clama aos céus. Não espere jamais ser compreendido por quem favorece a opressão dos pobres.
10. Faça da oração um antídoto contra a alienação.
Orar é deixar-se questionar pelo Espírito de Deus. Muitas vezes deixamos de rezar para não ouvir o apelo divino que exige a nossa conversão, isto é, a mudança de rumo na vida. Falamos como militantes e vivemos como burgueses, acomodados ou na cômoda posição de juízes de quem luta.
Orar é permitir que Deus subverta a nossa existência, ensinando-nos a amar assim como Jesus amava, libertadoramente.
Frei Betto é escritor, autor do romance sobre a Amazônia “Tom vermelho do verde” (Rocco), entre outros livros. Livraria virtual: freibetto.org
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